jfm

21.5.06

Do lado de lá

No meio de uma visita ao Oceanário de Lisboa. E uma inundação da sensação de estar 'de fora'.
Sermos capazes de nos colocar do lado de lá é muito complexo. Sair da pele e 'olhar de fora' - perguntar 'mas o que é isto? esta coisa onde estou? estou?! o que quer dizer estou?' e de seguida sentir uma vertigem enorme como se se estivese a entrar em território vazio.
Não dá para explicar. Mas é uma sensação ambígua de prazer e de terror. É como habitar outro. Outro tudo.

Aí ele chamou-me à Terra: "Agora nós eramos peixes, eu era o tubarão e..."

14.5.06

Não esquecer de brincar

É fascinante o mundo das crianças (ou o mundo como elas o constroem). Não é só porque tudo ganha vida mas também porque é uma visa que vive com elas e que cresce e se desenvolve à sua medida. É por isso que tuod serve para brincar e que os objectos (mesmo aqueles que têm objectivamente um significado intencional) são literalmente extensões da mente das crianças.

É preciso não esquecer de como é brincar, e de brincar.

Quem se contenta...

"Era uma vez um país onde tudo era proibido.
Ora como a única coisa não proibida era o jogo do mata, os súbditos reuniam-se em certos campos que ficavam por detrás do país e aí, jogando ao mata passavam os dias.
E como as proibições vieram umas de cada vez, sempre por motivos justificados, não havia ninguém que achasse mal ou não soubesse adaptar-se.
Passaram os anos. Um dia os notáveis do país viram que já não havia razão para que tudo fosse proibido e mandaram arautos avisar os súbditos de que podiam fazer o que queriam.
Os arautos foram aos locais onde costumavam reunir-se os súbditos.
- Saibam - anunciaram - que já nada é proibido.
Eles continuaram a jogar ao mata.
- Não perceberam? - insistiram os arautos. - São livres de fazerem o que quiserem.
- Muito bem - responderam os súbditos. - Nós jogamos ao mata.
Os arautos bem se afadigaram a recordar-lhes todas as ocupações boas e úteis que haviam tido no passado e poderiam ter novamente de agora em diante. Mas eles não ligavam e continuavam a jogar, um lance a seguir ao outro, sem pararem sequer para ganhar fôlego.
Vendo que as tentativas eram vãs, os arautos foram dizê-lo aos condestáveis.
- Resolve-se bem - disseram os condestáveis. - Proibimos o jogo do mata.
Foi então que o povo fez a revolução e os matou a todos.
Depois, sem perder tempo, tornou a jogar ao mata."

(Italo Calvino, Quem se contenta, em A Memória do Mundo, 1993, Editorial Teorema)

Pois é, a força da conformidade é tremeda e muito dificilmente escapável. Resta resistir.

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